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Pelvic Care Blog

Artigo Revista Pais & Filhos (Dez 16) - Reabilitação pélvica como norma no pós-parto? Pois sim,


Em Dezembro do ano passado foi publicado um artigo meu de opinião na Revista Pais & Filhos. Deixo-vos aqui o artigo na integra.

Consultar um fisioterapeuta especialista em reabilitação pélvica após a gravidez e o parto, não é de facto, um cuidado de saúde padronizado no nosso país, mas.... Deveria ser!

Então porque todas as mulheres deveriam ter pelo menos uma consulta após o parto? A gravidez é uma das fases mais normais de disfunção. Os seus ligamentos encontram-se laxos, a sua postura descoordenada e desalinhada, o útero cresce exponencialmente, os órgãos são puxados para o lado, o centro de gravidade desloca-se para fora, rapidamente ganha peso, e alguém passa os seus dias a dar pontapés dentro da sua barriga. Retornar o corpo da mulher para a sua função normal e de alinhamento é um investimento a longo prazo.

Vejo muitas mulheres no meu consultório apresentando prolapsos após a menopausa. Estas mulheres provavelmente já apresentavam alguma disfunção prévia á menopausa, talvez porque não reabilitaram o períneo ou porque realizaram exercício físico incorretamente, sempre forçando esta musculatura. É por isso que os seus corpos ainda se encontram neste estado de pós-parto por 30 anos. Então vem um dia, a fazer um esforço mais forte, por exemplo, mudar os móveis começam a sentir um peso no baixo ventre, depois um desconforto e aí aparece o tal famoso prolapso. Tudo isto, pois os seus corpos não voltaram ao seu estado saudável.

Existe depois o parto. Independentemente de como ocorreu, algo muito grande está a sair do seu corpo, quer através de um buraco relativamente pequeno ou pelas camadas de tecido abdominal. A gravidez e o parto inevitavelmente deixam uma marca no corpo da mulher.

Após o parto, todo o foco da mãe é direcionado para o bebé, e na maioria das vezes, esquece-se de nutrir e cuidar do seu próprio corpo. O corpo é deixado de parte, para se recuperar sozinho. No momento em que a mulher se apercebe de que o seu corpo não está a retornar convenientemente ao seu estado pré-parto, esta já está de volta ao trabalho, às demandas de outras crianças e/ou responsabilidades. O seu próprio bem-estar está na última linha da lista de tarefas.

Seis semanas após o parto, a mulher realiza um check-up médico, onde se avalia o útero, fazem-se perguntas sobre a alimentação e como se sente (check-up para avaliarem algum sinal de depressão pós-parto). Mas isto é insuficiente. Culturalmente, temos vindo a aceitar que uma vez que o bebé nasce, o foco deve ser sobre o bebé. Este paradigma faz com que qualquer tipo de cuidados maternais adicionais, pareçam um luxo.

Mas as alterações, desconfortos e dores físicas após a gravidez e o parto são muito reais. A maioria dessas alterações e desconforto tem origem num colapso do core (é o centro do nosso corpo, conjunto de músculos responsável pelo nosso equilíbrio e pela adequação postural do tronco em qualquer movimento) e do pavimento pélvico, o que faz com que se algo não está a funcionar corretamente, então tudo o que tem que trabalhar em torno ou com este, basicamente, não funciona também.

As alterações físicas mais comuns após o parto são a incontinência urinaria e fecal, lombalgias persistentes, dores pélvicas, alterações relacionas com a cicatriz da cesariana ou da episiotomia, dor durante o ato sexual e prolapso dos órgãos pélvicos (sensação de peso no baixo ventre, ou como se sentasse em cima de uma bola de ténis). Por exemplo, se não existe um suporte muscular pélvico correto e a mulher sofrer de obstipação crónica, poderá levar ou exacerbar prolapsos dos órgãos pélvicos.

A boa notícia é que estes sintomas estão entre alguns dos mais comuns e tratáveis. A má notícia é que a maioria das mulheres não procura ajuda ou opta pela cirurgia como primeira solução, o que às vezes é necessário, mas tem as suas próprias complicações.

Algumas mães realizam um check-up com fisioterapeutas simplesmente como uma segurança para iniciarem a sua atividade física, ou para terem a certeza que “está tudo bem lá em baixo”. Podem não apresentar algum tipo de sintoma, apenas procuram voltar á sua vida com a certeza que está tudo bem.

Quando as minhas pacientes me chegam ao gabinete, vêm sempre muito receosas sobre o que se vai passar durante a avaliação e tratamentos. Inicio a consulta a explicar, usando como exemplo, uma dor na coxa, ou uma entorse. A área pélvica, é uma área como outra qualquer, temos de tirar o medo e o tabu.

A maioria das mulheres não sabe onde se situa o seu períneo, e muitas das vezes, nem o sabe contrair. Isto acontece porque não vemos, nem temos perceção dessa área. Se falarmos num braço, nós conseguimos ver o movimento, já os nossos músculos pélvicos, nem por isso. Até o movimento realizado por esta musculatura é diferente. Estes músculos apresentam a capacidade de elevar, contrair, apertar... Além de que, a nossa pélvis, é a base da nossa estabilidade. Tudo flui a partir desse ponto, por isso se algo não está bem, tudo o resto vai estar alterado.

A reabilitação pélvica é também algo muito íntimo, especialmente quando vamos tratar problemas vaginais ou rectais. Uma boa comunicação e empatia com o profissional que a vai tratar é importante. Com as minhas utentes eu sou bastante frontal e descritiva. É importante estar sempre a informar o que se vai avaliar, onde vou se vai colocar as minhas mãos, o que poderá sentir, etc. Não se pode forçar ninguém para além da sua área de conforto.

Os tratamentos, (na sua grande maioria) envolvem correção postural, ensino correto das contrações pélvicas (as chamadas contrações de Kegel) e electroestimulação. As contrações podem ser ensinadas manualmente, ou usando o biofeedback. Neste último caso, é mais eficaz. É fornecido um estimulo visual e sensitivo, que permite perceber a contração correta dos músculos.

No sistema de saúde francês, a reabilitação pélvica é tratamento standart no pós-parto. Todas as mulheres têm direito a 10 a 20 sessões de reabilitação pélvica, com um fisioterapeuta especializado, como parte do plano de saúde.

Em Portugal, a reabilitação pélvica existe, por isso, se a mulher tiver interesse em ser consultada, pode sempre pedir ao seu médico se indica algum fisioterapeuta, ou fazer uma pesquisa online.

O maior paradigma que temos de mudar é: a dor pélvica, dor durante o ato sexual, perder uma gota de urina quando ri ou tosse, ou mesmo durante os exercícios físicos, não deve ser considerado de todo normal.

Ft. Soraia Coelho

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